Walace Gomes Leal, neurocientista da UFOPA |
“Metade das pessoas que se suicidam têm
depressão”, afirma o neurocientista Walace Gomes Leal, da UFOPA (Universidade Federal do Oeste do
Pará), em entrevista ao portal BJ, onde o ele também escreve sobre neurociências
com regularidade
"O acompanhamento médico é fundamental, pois a depressão TEM CURA" |
“A depressão é uma doença que tira a
vontade de viver, a motivação e enche a pessoa de pensamentos negativos. Ela
ocorre por inibição dos centros de recompensa do cérebro, núcleos de neurônios
que liberam dopamina ou serotonina e criam uma sensação agradável”.
Para
Gomes Leal, 50 anos, a família deve ficar atenta para os sinais que a pessoa
acometida pela doença emite.
“Não permitir que o indivíduo se isole
demais, conversar sobre o problema. Lembre-se que as pessoas depressivas que
tiram a própria vida sempre estão sozinhas. Devem-se perceber os sinais”,
aconselha.
Clique no link abaixo e leia a
entrevista exclusiva que ele concedeu sobre o tema.
Fonte: Blog do Jeso 👇👇👇👇👇👇
— Por que depressão e suicídio, do ponto
de vista da ciência, andam tão juntos?
— A
depressão é uma doença que tira a vontade de viver, a motivação e enche a
pessoa de pensamentos negativos. Ela ocorre por inibição dos centros de
recompensa do cérebro, núcleos de neurônios que liberam dopamina ou serotonina
e criam uma sensação agradável. A diminuição dessas substâncias químicas deixa
a pessoa bem infeliz. Qualquer adversidade torna-se um grande fardo. Metade das
pessoas que se suicidam tem depressão.
Ambas
as condições podem ocorrer devido a diminuição da neuroplasticidade, a
capacidade do cérebro adaptar-se a novas situações. Um estudo de pesquisadores
da Universidade Columbia, em Nova York, sugere que a resiliência ao suicídio
depende da neuroplasticidade.
Os
pesquisadores acharam um volume maior do giro denteado do hipocampo, uma região
neurogênica, nos cérebros de pessoas que tiveram depressão severa e não se
mataram. Nos não resilientes, isso não foi encontrado. Outros aspectos estão
envolvidos. Por exemplo, pessoas com transtorno bipolar suicidam se mais que
outros indivíduos.
— A pandemia potencializou os casos de
depressão, segundo dados estatísticos. Por quê?
— O
Brasil é um dos países que possui mais casos de depressão e ansiedade no mundo
e isso foi muito agravado pela pandemia. Segundo um estudo da Universidade Estadual
do Rio de Janeiro, houve um aumento de 90% de casos de depressão no Brasil em
2020.
Outro
estudo, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mostrou que houve um
aumento de 80% dos casos de ansiedade. As desordens afetivas são o novo mal do
século. É meio bilhão de pessoas no mundo com depressão, ansiedade, transtorno
de estresse pós-traumático e outras desordens afetivas. São 300 milhões de
pessoas no mundo com depressão. 12 milhões só no Brasil.
O
isolamento social, o medo da morte, a morte de amigos, parentes e 600.000
pessoas no Brasil, um governo inoperante e negacionista, a instabilidade
econômica, tudo isso gera estresse e o estresse crônico, as adversidades da
vida, são os principais gatilhos para depressão e ansiedade.
— O que há de descoberta mais recente da
neurociência sobre a depressão?
Uma
das descobertas mais interessantes é o potente efeito antidepressivo da
cetamina, uma droga conhecida por seus efeitos como anestésico geral (Ketalar).
Descobriu-se primeiro em animais de experimentação que uma única injeção de
cetamina em ratos com estresse crônico (modelo experimental de depressão)
reverte os efeitos de depressão em horas. Como a própria cetamina vicia, os
cientistas usaram uma modificação química da cetamina, as escetamina.
Esse
fármaco foi testado em humanos e possui um potente efeito antidepressivo em
horas. Além disso, como mostraram os testes realizados nos Estados Unidos, o
spray de escetamina diminui a ideação suicida (vontade de se matar) em 24
horas, segundo os estudos clínicos. O problema desse fármaco é o preço elevado.
Nos Estados Unidos, sem incluir impostos, um tratamento completo custaria em
torno de 20.000 reais.
Um
artigo publicado recentemente no periódico científico Nature, mostrou que a
cetamina inibe um núcleo chamado habênula lateral, o qual inibe os centros de
prazer do cérebro, os chamados centros de recompensa. Ou seja, na depressão os
centros neurais que nos deixam felizes estão inibidos por uma conexão neural
envolvendo a habênula lateral. A escetamina parece resolver parcialmente este
problema.
— Aqui no BJ o senhor escreveu um artigo
sobre os efeitos positivos de atividades físicas na depressão.
Sim.
É uma questão científica interessante chamada Hipótese Neurogênica da
Depressão. Ela diz que a depressão pode surgir da diminuição dos novos
neurônios que são produzidos no cérebro adulto, em uma região chamada giro
denteado no hipocampo. Vários estudos em animais mostraram que esses novos
neurônios controlam o estresse inibindo certas vias neurais que o facilitam.
Por
exemplo, o hipotálamo libera hormônios que influem a função das glândulas suprarrenais
que ficam em cima dos rins. Essas glândulas regulam o estresse. Na situação de
estresse crônico, elas liberam cortisol e outro hormônios que podem matar os
novos neurônios do hipocampo gerando um ciclo vicioso: mais estresse, mais
morte de neurônios, menos controle do estresse. Isso geraria depressão e
ansiedade.
Como
a atividade física é um potente indutor de neurogênese, ela serviria para
minimizar os sintomas de depressão e ansiedade, principalmente quando praticada
em ambientes naturais durante o chamado exercício verde. Isso é interessante,
pois o exercício verde pode tornar-se uma importante terapia adjuvante para a
depressão. Alguns psicólogos e psiquiatras já prescrevem atividade física para
pessoas depressivas. Existe um grupo nos Estados Unidos que faz isso liderada
pela neurocientista e psiquiatra Trace Shors. É o chamado MAP-TRAINING –
treinamento físico e mental. Eles usam dança, como zumba, e meditação, como a
atenção plena (mindfulness) para tratar pessoas com depressão e ansiedade.
— Existem pessoas com predisposição para
depressão?
—
Sim. Em uma minoria dos casos, existem fatores genéticos que podem predispor
indivíduos a depressão. São os chamados casos familiares. O mesmo é válido para
ansiedade e é muito comum pessoas com depressão também terem ansiedade. Mas a
maioria dos casos não tem uma base genética, são os chamados casos esporádicos.
O estresse crônico é o principal indutor de depressão.
— O que os familiares, amigos, colegas
de uma pessoa com depressão pode fazer para ajudá-la a superar esse quadro
clínico?
—
Muito apoio e companhia. Não permitir que o indivíduo se isole demais,
conversar sobre o problema. Lembre-se que as pessoas depressivas que tiram a
própria vida sempre estão sozinhas. Devem-se perceber os sinais. Acompanhar a
pessoa em uma caminhada, uma corrida, a visita a um parque, é muito importante,
pois, como mencionado, isso aumenta a neuroplasticidade.
O
acompanhamento médico é fundamental, pois a depressão tem cura. Na maioria dos
casos, antidepressivos podem ser usados. Além do tratamento com fármacos, a
terapias adjuvantes mencionadas são muito importantes e em grandes centros de
pesquisa no mundo elas já são indicadas. Inclusive muitas clínicas nos Estados
Unidos já instalaram academias em suas dependências para que os pacientes façam
atividade física.
O
tema do setembro amarelo, o mês de prevenção e combate ao suicídio, foi: VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO. O apoio para as
pessoas com depressão e ansiedade é fundamental, pois estas desordens afetivas
ainda são muito estigmatizadas na sociedade. Uma pessoa que tem sonolência excessiva,
baixo alta estima e motivação pode ser tachada por ignorantes de preguiçosa,
enquanto pode estar com depressão, umas das doenças mais abrangentes e graves
da atualidade e que pode levar a morte.
A
resiliência mental é maior força transformadora de realidades. Sem uma saúde
mental adequada não avançamos em nenhuns aspectos das nossas vidas. Isso deve
ser altamente considerado pelas autoridades de saúde desse país, em todos os
níveis de atuação.
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